terça-feira, 11 de junho de 2013

Espírito Santo > Inaugura hoje em Vitória, a exposição de pinturas de Rodrigo de Castro


A pintura geométrica de Rodrigo de Castro é um interessante percurso pessoal: uma meditação sobre a configuração do mundo. Existe um livro sobre o seu trabalho, no prelo, com dois ensaios meus. Agora Rodrigo de Castro criou uma série sobre papel com o rigor formal habitual e aguda sensibilidade. No limite da forma. Ele andou sobre o fio da navalha: os bons gostam do perigo.  É esta série que ele, a partir de hoje, mostra em Vitória, ES. 


Campos de meditação.

Jacob Klintowitz

A capacidade da pintura de Rodrigo de Castro de criar particulares universos se renova de maneira permanente. Cada pintura se oferece ao olhar como uma experiência primeira e única. Deste ponto de vista, a de uma iniciação cíclica, ela tem a natureza infinita. E, como objeto de atenção, como relação estrutural contida em si mesmo, é um espaço gerador de pensamento e consciência. Um campo de meditação. E, no entanto, esta pintura é desprovida de ornamentos, aparenta ser simples na concepção e no fazer. Isto faz parte de sua inteireza.

É possível significar, expressar, revelar, criar a mais pura e intensa emoção por meio de uma estrutura geométrica. E é possível criar um espectro cromático sinfônico, feito, ora de harmonias, ora de contrastes simultâneos, com cores de pouca textura e perfeitamente delimitado por linhas retas. É o que reafirma esta série de pinturas sobre papel de Rodrigo de Castro.

As cores têm características e personalidades próprias, e servem ao pintor como delicados sinais de sua sensibilidade, e são por ele obtidas por misturas e superposições, nas quais os bastões são instrumentos intermediários. Talvez a dificuldade de obter a tonalidade única e desejada a partir de bastões e a obrigatória persistência faça parte da introspecção de Rodrigo de Castro. Uma maneira particular de entrar em contato consigo mesmo. Distrair as mãos para o pintor costuma abrir outras portas.

A pintura pode ser, como é o caso de Rodrigo de Castro, um laboratório quase natural, ou seja, sem o controle cientifico ou de objetividade exacerbada. Esta naturalidade, esta fluência, é parte do humano. Trata-se de uma intencionalidade integrada, apenas em parte comandada pelo consciente. O paradoxo consiste em que essa experiência vital, não racional, nos torna mais consciente. Ver é uma vivência complexa e completa.

Nesta série, a pintura de Rodrigo de Castro está sempre em relação. Há uma estrutura geométrica que contém e organiza as cores. Estas são, na sua maioria, únicas, por inventadas. E dialogam entre si. É o que nos dá a sensação de que estamos diante de uma oculta pulsação. É porque, na verdade, estamos diante de uma pulsação cromática, constituída de refrações e emanações. E as cores obedecem a um princípio ordenador independente da geometria e que é dado pelo uso delicado dos brancos. É como se ele presidisse a organização do espaço cromático. Estes brancos, também eles elaborados pelo pintor, têm esta importância geradora na sua pintura.  Sabemos todos que o branco é a cor de mais difícil uso na pintura, segundo a tradição histórica. Talvez Rodrigo de Castro, com o seu amor à sutileza e à economia de gestos, colocasse para si mesmo este desafio maior, uma série de pinturas onde a dominante fosse a cor branca.

Curioso como esta densidade cromática de pouca textura nos remete, algumas vezes, para correlações. O céu de Vincent van Gogh, é feito de texturas e de estrelas. E a cor densa e sem textura em Rodrigo de Castro, com a sua suave pulsação, semelha um céu de estrelas ocultas. A abstração permite certas sensações. Malevich, um dos pioneiros da nossa visualidade, fala, ao comentar o seu próprio trabalho, em sentimento da ausência do objeto.

Não é incomum associar a abstração geométrica com o universo do delírio e da supressão da realidade. Seria, então, o discurso da fantasia. Neste caso até Deus, para os que acreditam, seria um fantasioso, pois os universos conhecidos são feitos de formas abstratas. Não sei se pinturas de Rodrigo de Castro nos revelam a realidade. Ou se constroem uma realidade inusitada. O que é exatamente a mesma coisa. Pois o que pensamos ou nomeamos existe. O que é evidente no contato com a pintura de Rodrigo de Castro é a sensação enriquecedora da nossa consciência ao mergulhar na articulação linguística criada pelo artista e constituída de geometrias, invenções e relações cromáticas, emanações e pulsações.

Rodrigo de Castro, na organização e suavidade de sua pintura, é surpreendente.  Parece que é impossível fazer algo renovador com a geometria. Primeiro, ela está em tudo. Não só no universo, mas nos objetos do cotidiano, nas cidades, e nas ruas, nas revistas, nos livros. E depois, na própria arte, a geometria como expressão autônoma, tem mais de um século de intensa tradição. O que era um arcabouço, uma estrutura sobre a qual se realizava a grande pintura, tornou-se o próprio tema em arte. E esta emergência nos fez reavaliar a arte de outras civilizações em suas geometrias nas quais preconceituosamente víamos apenas formas ornamentais. Mais importante ainda é observar como um artista da geometria, como Rodrigo de Castro, tem uma individualidade marcante. A geometria na arte não é impessoal, mas formas complexas e inventivas capazes de nos trazer novos campos de reflexão e prazer.  


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