sexta-feira, 14 de setembro de 2012

São Paulo > Na galeria da A Hebraica", até 16/10, a exposição de Meiri Levin e Luise Weiss, “As inesperadas faces da memória”


Meire Levin e Luise Weiss: as inesperadas faces da memória.

Memória?

Jacob Klintowitz

Será memória esta arte que se arma em mistérios, saudade e  incompletude? Certamente não são estados de consciência do passado congelados no presente, como um museu que guardasse todas as dores da existência histórica coletiva e todas as doçuras da vida familiar.

Podemos nos perguntar o que pensariam os nossos bisavôs se pudessem contemplar as obras de arte criadas por Meire Levin e Luise Weiss que utilizam fotos e fotogramas de ancestrais como ponto de partida para a sua meditação visual. Eu acredito que eles, como eu, compreenderiam que este trabalho é matéria pulsante, criação a nos dizer que a cada novo ser o universo renasce. Estas obras de arte são habitantes inaugurais da nossa época.

Para os judeus a memória é tudo. E tudo é motivo de estudo e leitura. É o povo do livro. Mas maior do que todas as coisas é a própria vida. Esta é a prioridade e a razão ética primeira do judaísmo. Meire Levin apresenta “Nove pinturas e uma mala” e Luise Weiss nos mostra “Nove pinturas e um navio”. As duas artistas iniciam o seu trabalho com o reconhecimento da memória e o completam com a afirmação do primado da arte. Não é a consagração do estático. Trata-se de um canto ao movimento. Hoje o sol se levantou e é um novo dia.

Meire Levin elabora camadas sucessivas de texturas, como superpostas matérias temporais, a dar novos significados aos ícones fotográficos que fixa no suporte. Estas matérias interpostas entre o suporte e o nosso olhar esmaecem cada vez mais a figura, mas ela permanece lá para sempre, como o sedimento básico. A sua mala, já um documento visual histórico, é recoberta por imagens de passaportes que assinalam o último porto. E no seu interior a verdadeira bagagem do imigrante, fotos de ancestrais e páginas do códice religioso. A dupla aliança: a fidelidade tribal, como acordo terreno, e a fé na palavra divina, como aceitação do transcendente. Nove pinturas e uma mala.

Luise Weiss, artista de intensa tradição gráfica, torna os registros dos ícones ancestrais, fotografias e fotogramas, em paradigma psíquico. E é com este modelo interno como guia que elabora a sua pintura. Há na superfície delicada das suas imagens, nestes pigmentos dispostos por cerdas macias, a clara sensação de um cronos impreciso. A figura e o espaço são feitos do mesmo magma. O contorno das figuras – submerge ou emerge  – envolvo no entorno, como se não houvesse de maneira definitiva o ontem e o agora. E um navio, a ponte para outros espaços, o físico e o emocional. Nove pinturas e um navio.


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