João Carlos Lopes dos Santos
Venho notando um certo mistério que envolve a divulgação da tabela de preços de artistas. Tabelas fechadas a sete chaves...
Volta e meia, recebo telefonemas de marchands perguntando pela tabela de preços de artistas, mormente os consagrados, em atividade, já que as tabelas de preços morrem com os artistas, quando aí passam a viger só os preços de mercado.
Quase sempre, não tenho como responder. Acabo dando a minha opinião sobre o preço de mercado do artista questionado; porém, a tabela, de certo, já houvera tentado anteriormente, sem obter êxito. Os representantes do artista dizem que não têm certeza, que a tabela vai mudar, que vão conversar com o artista e que depois me retornam a ligação; e nada de a tabela aparecer...
Em nome da transparência
Fica aqui o meu protesto: é um verdadeiro absurdo os artistas – ou seus representantes – sonegarem aos profissionais de mercado a tabela de seus quadros. Se não querem vender para quem está perguntando, tudo bem, é um direito que lhes assiste; mas é um contra-senso sonegar a tabela ao mercado.
Tal recusa, além de prejudicar a necessária transparência dos negócios, dá margem a inúmeros equívocos, acabando por prejudicar o mercado do próprio artista, de vez que, nessa circunstância, o raciocínio dos marchands fica apenas atrelado aos registros de mercado, praticados nos leilões de arte, que, como se sabe, oscilam conforme a economia, a época, e a qualidade dos trabalhos vendidos nos leilões, que, de antemão se sabe, não são aqueles que os artistas gostariam de ver em pregão.
No Manual do Mercado de Arte, a respeito, escrevi:
"A tabela de preços para venda ao consumidor final (aquela sugerida pelo artista para a venda dos trabalhos nas galerias e que o mercado costuma chamar de tabela final do artista) e o preço de mercado (aquele que resulta da análise profissional, portanto subjetiva, de um somatório de valores que em geral se cristaliza nos leilões de arte) não são, necessariamente, a mesma coisa. O ideal é quando o artista consegue igualar tais preços, e muito melhor quando consegue a façanha de ter preços de mercado sempre superiores à sua tabela. A filosofia deste manual me impede de citar exemplos."
Outra informação que tem que ser disponibilizada aos marchands, juntamente com a tabela, é qual o percentual de desconto que os marchands e galeristas recebem no ateliê do artista. Segundo a praxe, os profissionais de mercado recebem no ateliê um desconto percentual sobre os preços da tabela, que varia de ateliê para ateliê. Os descontos internacionalmente consagrados são de 50%, quando o trabalho é efetivamente comprado pelos mencionados profissionais e de 33% em caso de consignação.
Por que será?
Será que as tabelas desses artistas estão com valores muito superiores aos preços praticados pelo mercado? Será por isso que não fornecem a tabela? São perguntas que ficam no ar, sem encontrar respostas.
Transcrevo outro trecho do MMA:
"A única fórmula correta de se montar uma tabela é tornar os seus valores sempre acessíveis ao mercado, é fazer com que a obra sempre seja procurada, que tenha absoluta liquidez. Mas como se consegue isso?
A estratégia é a seguinte: inicialmente se estabelece o nível de preços, um pouco abaixo do que seria a média das tabelas dos artistas do mesmo patamar de mercado; em paralelo a esta primeira tabela, promove-se uma filosofia correta de distribuição, tornando a obtenção dos trabalhos mais difícil, deixando claro que o preço é acessível, mas os trabalhos não. Esta deverá sempre ser a tônica da relação tabela–obra de arte. À medida que a procura aumenta, a tabela vai aumentando muito lentamente, acompanhando a demanda. É preciso ter só um cuidado: não aumentar demais. Tabela de preços não anda para trás. Portanto, muito cuidado ao fazer aumentos. Artista que reduz preço cai fatalmente no descrédito".
Prática reprovável
Outra prática, esta absolutamente reprovável, é a de alguns artistas usarem várias tabelas, com preços diferentes, dependendo da cidade ou do galerista. Essa prática é perigosa e costuma gerar confusões desagradáveis, que levam o artista a perder a credibilidade junto ao público. A tabela, além de acessível, tem que ser única em todo o país e, quando for o caso, no exterior.
Quem avisa, amigo é
Outra coisa que se pede, por ser de bom alvitre, é que os artistas não coloquem obras no mercado com uma multiplicidade exagerada de mistura de técnicas, diferenciando-as pelos preços na tabela, praticamente fazendo com que cada obra tenha um preço. Quando isso ocorre, aparecem as inevitáveis incoerências entre os preços das obras, assim como outros absurdos, verdadeiros corpos estranhos ao mercado de arte, fazendo uma enorme confusão – mormente, em confronto com a tabela de preços dos chamados originais. Estou me referindo àquelas obras em que o artista lança mão de técnicas, quase sempre mistas, que, atipicamente, recebem "rótulos particulares": (sic) "desenho a óleo sobre tela"; "serigrafia sobre tela, encorpada com acrílico"; "técnica mista sobre tela, predominando o óleo" e vai por aí...
Como se sabe, o preço de uma obra de arte não é determinado pela quantidade de tinta que o artista coloca sobre a tela, tampouco pelo tempo que levou para pintá-la. Se alguma coisa tem de ser mensurada, é a qualidade da obra e a freqüência de sua demanda.
Os artistas, com essa filosofia heterodoxa, objetivam tornar o design de seus trabalhos mais acessíveis; tudo bem, mas há casos em que obras visualmente iguais têm preços nitidamente diferenciados. Exemplificando: na tabela, uma pintura original, peça única, custa R$ 25 mil; e uma "serigrafia sobre tela, encorpada com acrílico", daquele original, sabidamente uma peça múltipla, custa R$ 5 mil reais. Se osmarchands não entendem e nem sabem explicar, o que dizer dos não-iniciados em mercado? O mercado não perdoa e, quase sempre, esta confusão acaba por nivelar tudo por baixo, isto é, o preço de referência mais importante acaba sendo o de valor mais baixo.
Livre criatividade e a
rigidez do mercado
rigidez do mercado
Ninguém está querendo tolher a criatividade de ninguém, tampouco restringir o uso de suportes, muito pelo contrário; o que aqui se propõe, é que seja mantida a nomenclatura tradicional determinada pelo mercado, em nome de uma diferenciação de trabalhos na tabela de preços. Daqui a pouco, vai ter gente cobrando pelo trabalho, conforme o número de elementos ou personagens pintados na tela, rotulando-o a seu bel-prazer.
É um procedimento perfeito, informar no corpo ou reverso da pintura que se se trata de um esboço, um estudo ou um improviso; contudo, tais trabalhos vão continuar a ser designados conforme suas técnicas, a saber: óleo sobre madeira, acrílica sobre tela, óleo sobre cartão, técnica mista, desenho, aquarela, guache etc.
Pode-se e deve-se cotar diferentemente, na tabela, um determinado tema, quando ele é muito mais procurado pelo público em relação aos demais temas pintados pelo artista. Por quê? Porque é necessário proteger esses temas da repetição sugerida pelo público, evitando que os artistas os pintem até a "exaustão"... Mas, como foi dito acima, a sua nomenclatura continuará a mesma.
Mais um complicador
Para complicar mais um pouco a vida dos marchands, está chegando aos poucos ao Brasil um processo de impressão à máquina, muito comum nos Estados Unidos da América, lá chamado de canvas' printer – em bom português "impressora de telas" -, que apresenta um resultado "idêntico" à pintura original. O produto dessas máquinas é a print over canvas – "impressão sobre tela" – que pode, deve e tem que ser vendida bem mais barato, já que se trata de uma impressão. Nesse caso, algumas providências são fundamentais: 1. que o artista controle com rigor a quantidade de cópias; 2. que as numere e assine; e 3. que seja colocado no reverso, claramente, que se trata de uma impressão sobre tela. Se isso não for feito, quando o trabalho cair em mãos pouco escrupulosas, incautos poderão ser enganados. Há que se ter os olhos bem abertos...
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