quarta-feira, 15 de junho de 2011

Você tem medo da Internet?





     Vai ser muito difícil para as pessoas viverem à margem dos computadores e da internet. Iniciei tarde - depois de muito relutar -, aos 53 anos. Mas vamos direto ao fato gerador da minha conversão ao veículo da rede mundial.

     Um dia, encontrei um menino de 83 anos que andava meio sumido.

     – Como é que é Thomaz, sumiu?

    – É meu querido amigo, comprei um brinquedo novo: um computador.

    – Thomaz, você consegue mexer naquele negócio, rapaz? O comportamento do Thomaz nos estimula a vê-lo sempre como um rapaz...

    – Claro, é muito fácil. Respondeu ele.

     Fiquei arrasado. Afinal, tinha um livro na cabeça - Manual do Mercado de Arte – e precisava passá-lo para o papel, mas aos 53 anos me achava velho para esse tipo de tecnologia. Enchi-me de coragem e comprei um computador. Depois de um ano, sem cursos ou qualquer outro tipo de orientação – o que hoje não aconselho a ninguém –, o livro estava pronto.

Apesar de tudo mais

     Ao que me parece – e aos outros amigos dele –, Thomaz, pelo menos nesses 25 anos que o conheço, não faz muito por onde ser o longevo saudável que é. Acorda e dorme tarde, pega sol da tarde, gosta de beber todas, mas bêbado nunca o vi, sempre comeu fora de hora e, principalmente, aqueles salgadinhos de lanchonete, pelo menos nesse longo tempo em que sou seu incondicional amigo.

     O cigarro é um capítulo à parte. Até os 85 anos, depois de dar um susto na gente, no início de 1999, fumava três a quatro maços de cigarros por dia. Agora, diz que parou. Há quem acredite nisso, em ‘Papai Noel’, ‘Coelhinho da Páscoa’ e, principalmente, em ‘Cegonha’... 

Testando a resistência

     Mas vamos falar do sobredito susto. Soube que ele tinha feito uma cirurgia de próstata, em meados de 1999, isto aos 85 anos. Nada grave: em tal idade, este tipo de cirurgia é inevitável.

     Para fazer de uma longa história, outra bem curta, o nosso Thomaz, logo a seguir, pegou uma infecção hospitalar. Ficou pele e osso. Recuperou-se um pouquinho e, logo após, no verão de 2000, pegou uma pneumonia, constatada quando estava numa reunião da ACNI – ele é o Presidente da Comissão de Legislação e Normas da Associação dos Condôminos de Nova Ipanema, na Barra da Tijuca –, reunião que, por tal motivo, foi adiado, de vez que ele era o relator da matéria a ser votada. Ficou, de novo, pele e osso. 

     Entre seus amigos era unânime a conclusão: É uma pena, mas dessa vez o General Thomaz Câmara entrega os pontos e vai sair da cena de guerra... Outros, mais objetivos, diziam: Não sei não, mas acho que o General vai morrer... 

O segredo da longevidade

     Ledo engano, uns dois meses depois, já no inverno de 2000, que ficará na história como sendo um dos mais frios, todo mundo agasalhado no Clube de Nova Ipanema, chega o Thomaz da sauna, gordinho, forte, saudável e sem camisa... 

   Após os comentários de praxe, um sai com a gracinha: Também, pudera, ele não tem mulher e nem filhos para aporrinhá-lo... 

     Sem conferir razão à sobredita tese e nem, tampouco, achá-la possível, já que tenho juízo e amor à vida, o nosso Thomaz jamais se casou. Namoradas dele, eu conheci muitas. Fala-se de grandes paixões, umas correspondidas outras não... Mas isso não nos interessa, porque coração é terra que ninguém pisa... 

     Até hoje, aos 89 anos de idade, Thomaz me manda e-mails falando em obsolescência instantânea dos objetos, em futuro, em século 21, em programação, em estudos, em treinamento pessoal, das últimas novidades da informática, etc.

     Mesmo muitas vezes impactado, é este o General Thomaz de Albuquerque Câmara que conheço, o meu longevo mestre de sabedoria útil e aplicável. Tenho um grande orgulho em sermos amigos. Que Deus lhe dê muitos anos de vida, para que ele possa passar essa vitalidade, combatividade e sabedoria à garotada cinquentona que anda se achando meio devagar... 

     E você, ainda está se achando velho para mexer com computador?

*   *   *

     Hoje, dia 16 de julho de 2003, aos 89 anos, numa manhã linda de inverno carioca, com céu azul e sem nuvens, o nosso querido Thomaz nos deixou. Seus amigos estão tristes e enlutados. Um dia tinha que acontecer... 

A trajetória militar

     Thomaz de Albuquerque Câmara, que nasceu no Recife-PE, em 24/5/1914, faz parte da História do Brasil. Na Revolução de 30, aos dezesseis anos, era aluno do Ginásio Pernambucano, pegou em armas contra o governo federal de Washington Luiz. Em 1932, com a notícia espalhada de que os paulistas desejariam se separar do Brasil, ele ingressou no recrutamento voluntário de jovens para fazer frente aos revoltosos. Assim, aos 18 anos ingressou, efetivamente, no Exército Brasileiro. 

     De pronto, como soldado, foi enviado ao Rio de Janeiro para integrar o 19o Batalhão de Caçadores, da Bahia, que estava acantonado no 3o Regimento de Infantaria, na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro. 

     Aí, começa uma carreira brilhante e vertiginosa. Um mês depois, passou no curso de formação de cabos, só ficando com as duas divisas por sete dias, tempo necessário para passar nas provas do curso de formação de sargentos. Aos 18 anos era sargento. 

     Fez concurso de admissão na Escola Militar do Realengo, hoje nas Agulhas Negras, com destino à Escola de Intendência. Aos 27 anos era Aspirante a Oficial e, em seguida, 2o Tenente. 

     Com 30 anos de idade, foi à Itália, integrado a FEB – Força Expedicionária Brasileira – e promovido a 1o Tenente. Aos 35 anos era Capitão. Aos 40, por merecimento, era promovido a Major. Aos 45, também por merecimento, foi a Tenente-Coronel.

     Encurtando esta longa história, aos 51 anos de idade, também por merecimento, repete-se a rapidez vertiginosa dos acontecimentos do início da carreira, foi promovido a Coronel. Meses depois, em 22/11/1965, o Presidente da República, por decreto de 4/10/65, resolveu promovê-lo ao posto de General de Brigada, de acordo com a Lei nº 288, de 8/6/1948, e transferi-lo, a pedido, aos 33 anos de carreira militar, para a reserva remunerada nesse posto, bem como promovê-lo na inatividade no posto de General de Divisão.

A vida civil

     Já na vida civil, aos 51 anos, não aceitou o otium cum dignitate que a vida lhe propusera. Aceitou sim o convite para organizar a empresa privada Intelco Radiocomunicações S/A, que introduziu o serviço de radiochamada no Brasil, popularmente conhecido como ‘BIP’, sua marca registrada. Na Intelco, desempenhou as funções de diretor executivo e vice-presidente. Afastou-se da empresa, depois de mais de dez anos de serviços prestados. 

A sua vida em Nova Ipanema

     Com o dinheiro amealhado em dez anos de vida civil, somado ao soldo de General de Divisão da reserva, pode comprar um apartamento em Nova Ipanema, o primeiro condomínio fechado da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, para onde se mudou em 1978, aos 64 anos.

     Desfrutou de Nova Ipanema como ninguém. Participou sempre da vida social, política e administrativa do Condomínio, onde foi Presidente da ACNI (Associação dos Condôminos de Nova Ipanema) e, por diversas vezes, Secretário do Colegiado e Presidente da Comissão de Legislação e Normas. 

     Até falecer, destacou-se pela sua contemporaneidade. Falava em obsolescência instantânea dos objetos, em futuro, em século 21, em programação, em estudos, em treinamento pessoal, sempre se atualizando. Fascinado por livros e boa música, deixou lida e relida uma belíssima biblioteca particular.

     Há uma crônica abordando como foi a sua maneira de ser e que você poderá ler clicando aqui. 

Elogio nos moldes militares

     Desde 1978, até falecer, em 16/7/2003, Thomaz foi meu amigo. Se tivesse que lhe fazer um elogio, nos moldes militares, diria: 

ELOGIO – Thomaz de Albuquerque Câmara foi um cidadão exemplar, nada constando, ao longo de sua vida e segundo o meu conhecimento, que desabone a sua conduta moral e pessoal. Sempre presente e, quase sempre, à frente das causas nobres. Foi de todos amigo e companheiro. Inteligente e culto, honesto e sincero, sóbrio e dotado de elevado espírito de cooperação, de fino trato e atencioso indistintamente com todos, e, como característica, manteve-se sempre sereno e pacífico diante das mais vis e indevidas ofensas. Contudo, tendo espírito combativo, sempre pelo bom combate, nunca se curvou diante das injúrias. Desinteressado das coisas materiais, sempre lutou por ideias. Foi notório o seu caráter ilibado. Tinha uma absoluta capacidade de trabalho, que, por vezes, chegou à exaustão, assim como um modo invulgar de se devotar à defesa de suas teses. Cumpre-me louvar o Cidadão que foi Thomaz de Albuquerque Câmara pelos bons serviços que prestou à comunidade de Nova Ipanema, onde teve oportunidade de exercer várias funções, nesses últimos 25 anos. Rio de Janeiro, 16 de julho de 2003. Assinado: João Carlos Lopes dos Santos – seu amigo e morador de Nova Ipanema.



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.